Telegrama de 1977 mostra que o consulado brasileiro nos Estados Unidos recebeu alerta sobre um suposto “plano de extermínio mundial” com uso de agentes letais
Um telegrama confidencial enviado ao governo brasileiro em 1977 revelou um episódio curioso e inquietante da história diplomática do país. O documento, encaminhado pelo consulado do Brasil em São Francisco (EUA), relatava o recebimento de um suposto plano de “guerra revolucionária químico-biológica” com o objetivo de destruir grande parte da população mundial e redefinir a ordem global.
O alerta partiu do então cônsul Raul de Smandeck, que afirmou ter recebido o material de forma inesperada e sem informações adicionais. Segundo ele, apesar das dúvidas sobre a veracidade do conteúdo, o caso merecia atenção das Forças Armadas.
“Sem entrar no mérito e credibilidade da questão, rogo submeter o assunto à atenção do Estado Maior das Forças Armadas”, escreveu o diplomata no telegrama encaminhado a Brasília.
O “Plano de Guerra Satan”
O dossiê anexado ao telegrama, intitulado “Plano de Guerra Satan”, tinha 14 páginas e foi enviado por um homem identificado apenas como “Mr. Thompson”, morador da Rua Geary, em São Francisco. O texto descrevia, de forma detalhada, uma estratégia para destruir centros urbanos em todos os continentes por meio do uso de agentes biológicos letais.
Entre os alvos listados no documento estavam Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre, Recife, Fortaleza e Niterói. Os Estados Unidos também aparecem com destaque como o principal foco de destruição, em uma operação nomeada “Stalin”, cujo objetivo seria o “extermínio completo” do país.
Armas biológicas e agentes letais
O plano previa a disseminação de seis agentes biológicos altamente letais:
antraz, botulismo, cólera, mormo, melioidose e peste pneumônica.
Esses agentes seriam produzidos e transportados clandestinamente, visando causar destruição em larga escala em mais de 500 pontos estratégicos no mundo, com estimativa de quase 600 mil mortes.
Segundo o texto, os ataques deveriam ocorrer durante o outono e em horários de pico, quando a circulação de pessoas é mais intensa. O objetivo, além do extermínio populacional, seria instaurar uma “nova ordem mundial”, dividindo a humanidade entre pessoas “desejáveis” e “indesejáveis”.
Contexto histórico
A década de 1970 foi marcada por tensões da Guerra Fria, com o avanço das armas nucleares e o temor global de destruição em massa. O ambiente de desconfiança e espionagem favorecia o surgimento de teorias conspiratórias e alertas sobre planos secretos de dominação.
Ainda assim, o telegrama do consulado brasileiro é um documento autêntico, hoje disponível no Arquivo Nacional, e representa um curioso registro do clima de insegurança e paranoia geopolítica da época.
Sem resposta do governo brasileiro
Não há registros de resposta do Itamaraty ou das Forças Armadas ao alerta emitido por Raul de Smandeck. Também não há indícios de que o “Plano de Guerra Satan” tenha sido levado a investigações formais.
Desde então, nenhum evento compatível com uma guerra biológica global — como o descrito no documento — foi confirmado.
O episódio, entretanto, continua sendo uma das passagens mais enigmáticas da diplomacia brasileira durante a Guerra Fria, e um lembrete de como a tensão política internacional da época produzia não apenas avanços científicos e militares, mas também ecos de medo e mistério que permanecem até hoje.
Fonte: Arquivo Nacional / Telegrama confidencial nº 153, Consulado do Brasil em São Francisco (1977)
Edição: Blog Olhar Digital.