Entenda as vulnerabilidades de cada bioma envolvendo segurança hídrica e mudança do clima

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Com dimensão continental e biomas heterogêneos, regiões do Brasil apresentam diferentes vulnerabilidades.

Os estudos de Impactos, Vulnerabilidade e Adaptação à Mudança do Clima da Quarta Comunicação Nacional do Brasil à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês) para a segurança hídrica lançam alerta sobre a atual situação de disponibilidade. Ao considerar a incidência de secas e os níveis de exploração de água, o documento descreve que a abundância de água cedeu lugar à preocupação com relação à utilização dos recursos hídricos.

“O Brasil tem dimensão continental e os biomas são heterogêneos. Cada bioma apresenta particularidades”, explica o especialista em clima e recursos hídricos, professor Daniel Andrés Rodriguez, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, sobre a síntese das principais vulnerabilidades atuais desses sistemas e como poderiam se comportar diante de cenários de mudança do clima. Rodriguez também é ponto focal da Rede Brasileira de Pesquisas sobre Mudanças Climáticas Globais (Rede CLIMA) do MCTI para a segurança hídrica nos estudos de IVA.
Outro aspecto que o pesquisador destaca é que há um problema de distribuição espacial da água no Brasil, que nem sempre se encontra nos locais ou proximidades onde estão as maiores demandas; e que a qualidade do recurso, ocasionado por poluição ou falta de preservação ambiental, também afeta a disponibilidade, visto que os instrumentos tecnológicos disponíveis para recuperar a água são muito caros.

Entre os biomas, os resultados mais críticos recaem para Caatinga, que apresentou a pior situação para a dimensão disponibilidade de água no presente, com muitas regiões nas quais a escassez de água é crítica. Veja quais as questões prioritárias apontadas pelo documento para cada bioma:

Caatinga: o bioma, principalmente associado ao Nordeste e ao semiárido, é caracterizado por um forte déficit hídrico. Parte é decorrente da sazonalidade de regime de chuvas, marcada por longas e severas estiagens que resultam em rios de regimes intermitentes, e parte pelas intensas retiradas de água pelos grandes centros urbanos e polos de agricultura irrigada. Os cenários futuros indicam redução das vazões e aumento de eventos extremos de secas. Além disso, há uma pressão antrópica forte incrementada por desigualdade social. “O alto índice de pobreza e a grande dependência da agricultura familiar faz com que os problemas de segurança hídrica sejam ainda maiores”, avalia Rodriguez.

Amazônia: o estudo aponta como principal desafio para o bioma a implementação de instrumentos de governança, que é um dos problemas na maioria dos biomas do país. Apesar de não apresentar déficit hídrico, os cenários de clima futuro indicam redução das vazões e aumento de eventos extremos de secas e cheias, situação que o bioma já tem enfrentado de modo exacerbado nos últimos anos. “O monitoramento [de água] é escasso na Amazônia, o que ocorre também no país inteiro, sobre quantidade e muito pior com relação às informações sobre qualidade. Isso condiciona mais a segurança hídrica”, explica.

Cerrado: atualmente, a relação entre oferta e demanda de água é de alerta. O bioma é associado ao déficit hídrico e pressionado pela produção agrícola. Em algumas regiões há intensa retirada de água para irrigação. “São terras produtivas com pouca água, então o desenvolvimento da agricultura necessita utilizar águas subterrâneas. Nos últimos anos houve um incremento dessa exploração”, sinaliza Rodriguez sobre os problemas com os aquíferos, que dispõe de instrumentos de gestão ainda frágeis. Segundo o pesquisador, o sistema o agrícola tem efeito sobre o sistema hidrológico, tanto quanto à qualidade de águas, quanto à regularização das vazões nas bacias.

Mata Atlântica: a principal pressão nesse bioma advém da presença de centros urbanos, como as regiões metropolitanas de São Paulo e Rio de Janeiro, nos quais estão concentradas as maiores demandas por água e, por vezes, com necessidade de importar o recurso de outras bacias hidrográficas. “Quando se implementa sistemas efetivos, não só se está importando um bem, um recurso [natural], mas também exportando um impacto”, alerta o pesquisador.

Outro aspecto que também envolve o crescimento urbano irregular é o baixo índice de saneamento básico, que provoca redução da qualidade das águas superficiais e subterrâneas. “O crescimento desorganizado das cidades não permite um bom planejamento do processo de urbanização, o qual contempla os sistemas de drenagem, que favorecem o escoamento das águas em eventos extremos de precipitação, minimizando inundações, alagamentos”, explica.

Pampa: as principais dimensões priorizadas pelo estudo envolvem a seguridade, como eventos de inundações e secas que devem aumentar no bioma, e a qualidade de água. Pressões socioeconômicas, tais como a demanda crescente de água para produção agropecuária, em especial para a produção de arroz irrigado, indicam fragilidades, associadas também ao controle das fontes de poluição difusa e à contaminação de lençol freático (primeira camada da água subterrânea). “O Brasil tem economia baseada em agricultura, precisa melhor monitoramento dos rios para conhecer melhor os efeitos da agricultura sobre a água”, explica.

Pantanal: apesar de oferecer uma boa disponibilidade hídrica, é um sistema muito vulnerável, sensível. Isso ocorre porque a biodiversidade depende da manutenção do regime hidrológico. O professor explica que todas as cabeceiras dos rios que aportam água para o bioma encontram-se na região do planalto central, que estão fortemente antropizadas. No Cerrado há uma presença importante de produção de grãos, em especial a soja, e de carnes. A implantação de reservatórios tem levado à modificação do regime hidrológico e da regularização dos rios. “A biodiversidade do Pantanal precisa desses pulsos de inundação e seca para sobreviver e manter os serviços ecossistêmicos”, analisa Rodriguez.

Saiba mais: O envio das Comunicações Nacionais à UNFCCC é um compromisso assumido pelo governo brasileiro em 1998, ao promulgar a adesão do país à Convenção do Clima. O envio dos dados atualizados deve ocorrer a cada quatro anos, conforme determina as regras do acordo internacional para países em desenvolvimento. O projeto executado pelo MCTI, por meio da Coordenação-Geral de Ciência do Clima e Sustentabilidade, conta com financiamento do Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF, na sigla em inglês), e tem o Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (PNUD) como agência implementadora.

Acesse aqui o documento da Quarta Comunicação Nacional do Brasil à Convenção do Clima e conheça em detalhes as análises de Impactos, Vulnerabilidade e Adaptação à mudança do clima que envolvem a segurança hídrica.

Acesse aqui os artigos científicos publicados na revista Sustentabilidade em Debate, editada pela Universidade de Brasília, que embasam as análises de Impactos, Vulnerabilidade e Adaptação à mudança do clima da Quarta Comunicação Nacional do Brasil à Convenção do Clima.

Fonte: MCTI (Ministério de Ciencia, Tecnologia, Inovação e Comunicação).