ENTREVISTA: Quanto tempo a humanidade suportaria se todos os chips do mundo parassem?

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Conversamos com o professor Adalberto Fazzio, pesquisador do Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano) do CNPEM/MCTI que é responsável pelo desenvolvimento de chips cada vez mais velozes.

Se por acaso todos os transistores, principal componente de um chip, parassem de funcionar, quanto tempo a humanidade suportaria? Não sobreviveria por mais de uma semana! A importância dos chips no planeta é incontestável.

No Brasil existem cientistas especialistas nesta tecnologia que desenvolvem pesquisas para criar chips cada vez mais rápidos.

O chip está em todo lugar; celulares, computadores, equipamentos domésticos, carros e aviões. Este componente, cada vez menor, também é estudado e desenvolvido pelo Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano) que pertence ao Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), organização social vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI).

Batemos um papo com o pesquisador Adalberto Fazzio, que é responsável por um estudo que desenvolve chips cada vez mais rápidos no LNNano.

O cientista é formado em Física pela Universidade de Brasília (UnB) e tem doutorado pela Universidade de São Paulo (USP), onde se tornou professor titular em 1990. Fazzio foi pesquisador visitante no National Renewble Energy Laboratory (NREL) nos Estados Unidos. Devido à experiência de muitos anos em pesquisa e políticas no campo da nanotecnologia, o CNPEM convidou Adalberto Fazzio para assumir a direção do LNNano em 2017.

MCTI – Sobre os microchips, pode se dizer que hoje a humanidade depende desta tecnologia?

Uma brincadeira que costumamos pensar é: Se por acaso todos os transistores (e/ou chips) parassem de funcionar, quanto tempo a humanidade suportaria? Não sobreviveria por mais de uma semana! Obviamente isso não é possível, mas mostra nossa dependência com esse dispositivo que somente veio para a utilização pela humanidade no meio do século XX. Para citar um único exemplo toda distribuição de alimentos no mundo é dependente de uma logística computadorizada! E é importante frisar que o Brasil é totalmente dependente desse insumo, o transistor.

MCTI – Qual a importância de ter microchips cada vez menores e mais resistentes?

A vantagem é termos transistores cada vez menores de forma que poderemos integrá-los em um número maior em um chip. Hoje temos na ordem de um bilhão de transistores em um único chip, e esses transistores já estão em dimensões nanométricas. E há um limite se continuarmos com a mesma tecnologia de Silício (Si) sob um óxido. A pesquisa, no entanto, não olha somente a dimensão, é preciso considerar também a rapidez do dispositivo. Para isso o campo da Física que tem tido muito progresso do ponto vista de pesquisa é a “spintrônica”. Ou seja, o sinal on/off do transistor seria mediado pelo “spin” do elétron. Estes dispositivos seriam muito mais rápidos. Quanto à resistência, ela está associada ao material utilizado, por exemplo, o quanto de temperatura o transistor resiste, o que leva a pesquisas com novos materiais para potencialmente substituir o Silício.

MCTI – Como está o avanço da tecnologia nesta área de microchips no Brasil e no mundo?

Do ponto de vista tecnológicos, no Brasil estamos fora do cenário mundial quando falamos de fabricação em escala de chips. Na verdade, no mundo o mercado é dominado por 3 a 4 grandes empresas. O que há no Brasil é uma pesquisa acadêmica em novas abordagens para aplicações pontuais. Temos que pensar em desenvolvimento de sensores em áreas especificas de interesse nacional. Impossível competir com as indústrias existentes.

MCTI – Qual a importância dos nanomateriais em especial na sua área?

Os nanomateriais podem apresentar propriedades físicas bem diferentes de quando estão em dimensões de “bulk”. Como minhas pesquisas estão relacionadas a propriedades eletrônicas, estruturais e magnéticas, quando estamos na dimensão Nano, fenômenos diferenciados podem aparecer. A mecânica quântica é a principal ferramenta para as minhas pesquisas nesses materiais.

MCTI – Qual a relevância do grafeno e como ele pode ser aplicado no dia a dia?

O grafeno é um material bidimensional, dizemos que é um material 2D. Até 2005 os físicos achavam que não poderia existir matérias 2D, estes seriam instáveis em qualquer temperatura. Mas, Geim e Novoselov, vencedores do Nobel em 2010, mostraram que uma folha formada por átomos de carbono em uma estrutura hexagonal seria estável. Foi a primeira vez que um material 2D era sintetizado. Um empilhamento de muitas dessas folhas é o conhecido grafite e uma única folha, ou camada, é o grafeno. O grafeno até hoje nunca foi aplicado em escala para a eletrônica, entretanto como compósito já é bastante utilizado para melhorar as propriedades mecânicas de materiais.  Na minha modesta opinião a maior importância do grafeno é ser o precursor de um número grande de materiais 2D, que foram descobertos e que têm grande potencial para aplicações em diferentes áreas. Hoje em dia há uma família muito grande de matérias 2D.

MCTI – Qual a importância da ciência e da pesquisa para o país?

Não há país desenvolvido sem uma ciência forte. A pesquisa é a forma de “inventar” para se chegar ao “inovar”.  Ela é a base da tecnologia. A soberania e independência de um povo vêm com a inovação tecnológica. Mas isso leva tempo, necessita de apoio do Estado e das grandes empresas para financiamento.

MCTI – Qual a dica o senhor dá para jovens que querem ingressar no caminho da ciência?

Exercite desde cedo a curiosidade. Veja a ciência da matéria (Física, Química etc.), a ciência da vida (Biologia, Bioquímica etc.) e a linguagem matemática (incluindo ciência de dados, computação etc.) como um todo integrado. Os problemas a serem abordados hoje em dia são interdisciplinares.  Todas as áreas são prazerosas e contém suas belezas. Embora nosso Ensino Superior seja muito disciplinar, o jovem tem a possibilidade de navegar nessas áreas. No próximo ano terá início a “Ilum – Escola de Ciência”, uma iniciativa do CNPEM em parceria com MCTI e MEC, que oferecerá a jovens estudantes um Bacharelado em Ciência, com uma visão bastante interdisciplinar. Vale a pena conferir!

MCTI – O senhor se considera uma inspiração para as futuras gerações de cientistas?

Sou um cientista como milhares que existem em nosso planeta. Talvez a maior inspiração seja a “transpiração”. Muito trabalho, perseverança, determinação, trabalhar em grupo e escutar.

Fonte: MCTI ( Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicação).