Pesquisadores fabricam similares 3D de estruturas biológicas para testagem de substâncias, medicamentos e controle de doenças.
A biofabricação é um campo de pesquisa, desenvolvimento e inovação multidisciplinar que combina princípios de engenharia, biologia e ciências dos materiais, pelo uso de processos de manufatura para criar construções que imitam, em certa medida, a arquitetura dos sistemas vivos no espaço (3D).
Pesquisa é voltada à prototipagem e fabricação rápida de miméticos de biofilmes, tecidos e órgãos por meio de bioimpressoras 3D, utilizando plantas do Cerrado
Esta área debutou no cenário científico com estratégias potenciais para engenharia de tecidos e medicina regenerativa, visando a produção de tecidos para reconstrução, órgãos para transplantes e modelos organoides para descoberta de novos fármacos. Mas agora diversas outras áreas se beneficiam desse campo emergente.
É exatamente esse o contexto de atuação de projeto realizado por pesquisadores do Laboratório de Nanobiotecnologia (LNANO) da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (Cenargen), com fomento da Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAP-DF).
A pesquisa é voltada à prototipagem e fabricação rápida de miméticos de biofilmes, tecidos e órgãos por meio de bioimpressoras 3D, utilizando plantas do Cerrado. O objetivo é prototipar e realizar a fabricação rápida de similares de estruturas biológicas para testes de investigação da atividade biológica de substâncias, medicamentos, novos cosméticos, agroquímicos, alimentos, etc.
“As estruturas originais são estruturas naturais, encontradas nos organismos vivos, que serviram de modelos para elaborarmos desenhos assistidos por computador (CAD). A partir destes, com bioimpressoras e outras técnicas de biofabricação, conseguimos construir, camada a camada, estruturas similares às originais. As estruturas similares construídas são os chamados modelos 3D bioimpressos”, explica o coordenador do projeto e pesquisador do LNANO, Luciano Paulino da Silva.
“A técnica de bioimpressão 3D vem sendo considerada o padrão ouro dessas estratégias que constituem algumas das inovações mais recentes em biotecnologia”Luciano Paulino da Silva, coordenador do projeto e pesquisador do LNANO
A iniciativa é pioneira no Distrito Federal no que diz respeito a fabricar similares de estruturas biológicas visando à realização de triagem de substâncias bioativas e nanomateriais. Também de modo pioneiro, nanomateriais foram empregados nos processos de biofabricação para conferir propriedades novas aos biomiméticos.
Bioimpressão
A manufatura aditiva, mais comumente conhecida como impressão 3D, é um processo de fabricação de objetos sólidos a partir de um arquivo digital contendo informações de coordenadas espaciais. A criação de um objeto impresso em 3D é alcançada por meio de um processo aditivo realizado pela deposição de camadas até a confecção do objeto inteiro utilizando variados tipos de materiais, incluindo metais, resinas, polímeros e, mais recentemente, até mesmo componentes biológicos como biomoléculas e células vivas.
“Quando componentes biológicos estão envolvidos no processo de fabricação e prototipagem 3D, o processo é denominado de biofabricação 3D e a técnica de bioimpressão 3D vem sendo considerada o padrão ouro dessas estratégias que constituem algumas das inovações mais recentes em biotecnologia”, ressalta Luciano Paulino.
Ele acrescenta que, com o uso da bioimpressão 3D, é possível a produção de pequenos arranjos organizados de células para ensaios de atividade “e até mesmo, no futuro, poderá permitir a fabricação de órgãos inteiros para transplantes”
O cientista explica que a bioimpressão 3D é um processo tecnológico para prototipagem em diversos tamanhos e formas, com níveis de organização hierárquica, variando de estruturas micrométricas até complexos, formados por camadas altamente organizadas de múltiplos tipos celulares e biomateriais.
De maneira geral, a função e viabilidade das células e componentes biológicos presentes e confinados nas estruturas bioimpressas em 3D são preservadas, permitindo que ambientes espaciais complexos de organismos sejam imitados (mimetizados), técnica que permite, inclusive, a redução da utilização de animais em experimentos e testagens.
“Portanto, ambientes biológicos são criados e organizados com o uso de bioimpressoras 3D e expandem o cenário de possibilidades para testes de compostos bioativos e nanossistemas que vão muito além de células isoladas e descontextualizadas, comumente empregadas em testes de atividade biológica in vitro em ensaios típicos”, conclui o pesquisador.
“A ampliação das possibilidades conferidas com as bioimpressoras 3D e materiais adquiridos com o projeto fomentado pela FAP-DF expandiu o escopo de atuação da equipe executora e colaboradores atuando no DF e em outras regiões do país”Luciano Paulino da Silva, coordenador do projeto e pesquisador do LNANO
Saúde pública
A equipe do LNANO tem empreendido esforços nos últimos anos para prospectar extratos vegetais, assim como realizar a síntese e caracterização de sistemas nanoparticulados utilizando plantas e outros organismos da biodiversidade do Cerrado, incluindo muitas espécies endêmicas no Distrito Federal.
O objetivo dessa vertente da pesquisa é produzir e caracterizar novos materiais organizados em nanoescala com potencial para aplicação no controle de patógenos, pragas e doenças que acometem plantas, animais e humanos.
Entretanto, o coordenador destaca um desafio recorrente encontrado pela equipe, assim como por profissionais que atuam na área de prospecção de substâncias bioativas: a baixa disponibilidade de modelos biológicos reprodutíveis para investigação dos efeitos desses materiais in vitro antes da realização de ensaios de atividade biológica in vivo.
Por isso, o pesquisador ressalta a importância da bioimpressão 3D: “A possibilidade de bioimpressão 3D de diversos tipos celulares e em diferentes condições experimentais, incluindo uma variedade de biopolímeros (como colágeno, quitosana, celulose, entre outros) e polímeros biocompatíveis (a exemplo do Pluronic), constitui uma alternativa eficaz para mimetizar (simular) o ambiente biológico para um patamar muito além daquele possibilitado pelos ensaios em camadas planares (2D) ou em células planctônicas em cultivo.”
Assim, ele afirma, “a ampliação das possibilidades conferidas com as bioimpressoras 3D e materiais adquiridos com o projeto fomentado pela FAPDF expandiu o escopo de atuação da equipe executora e colaboradores atuando no Distrito Federal e em outras regiões do país”.
O projeto recebeu apoio da FAPDF no âmbito do Edital 03/2016 – Demanda Espontânea. De acordo com Luciano Paulino, os resultados obtidos com o projeto disponibilizaram novas estratégias e metodologias para bioimpressão 3D com vistas ao confinamento de células em matrizes biológicas, biomateriais e materiais biocompatíveis para investigação dos efeitos de compostos bioativos e nanossistemas desenvolvidos pela equipe a partir de extratos de plantas do Cerrado.
Os estudos permitiram também o fortalecimento dessa linha de pesquisa na Embrapa Cenargen, assim como a continuação da formação de recursos humanos nas áreas relacionadas. O projeto ainda originou artigos científicos e apresentações em congressos.
*Com informações da Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAP-DF).